Pelos
comentários que ouvi e li antes de assistir o filme “que horas ela volta”
pensara que o foco principal do filme era simplesmente mostrar que filho de
pobre também pode escolher um curso em qualquer universidade e passar, enquanto
filho de rico com todas as condições favoráveis, pode escolher o mesmo curso, a
mesma universidade e reprovar... E de fato talvez ou certamente seja esse o
foco principal do filme e que obviamente é bem apresentado.
No
entanto, o ponto do filme que mais me chamou a atenção e me fez rememorar
várias situações comuns que observara no contexto social da minha infância,
adolescência e até mesmo nos dias atuais, é a parte que a ‘filha de Val’ joga
na cara dela ‘que ainda lembra quando ela chegava ao Nordeste toda arrumada,
cheia de presente, com dinheiro e parecia uma madame’ – descrevendo exatamente
como acontecia com quase todas as moças que eu conheci na época da minha infância e com várias colegas minhas de
adolescência que saiam do interior para trabalhar em casa de família nas
capitais do próprio Nordeste(Aracaju, Salvador) e São Paulo. E uma vez por ano
voltava toda arrumada, toda parecendo uma madame cheia de dinheiro e presente
que se acabavam em menos de um mês quando tinha que voltar a vida de empregada
doméstica, ou mesmo um pouco antes, quando elas não conseguiam se acostumar a
vida de humilhação e escravidão que era trabalhar em casa de família naquela
época.
E
tudo isso me deixava a morrer de medo do meu futuro de filha de pobre, e ter
esse mesmo fim. Felizmente os romances que li, os filmes que vi minha ânsia por
aprender coisas novas e questionar as velhas me levaram a outros rumos, rumos
diferentes de quase todas as meninas da minha época, e acho que é por isso que
especificamente o trecho supracitado do filme me cativou tanto, levando-me a
pensar nesses tempos.
Inegavelmente
“Que horas ela volta” é um daqueles filmes que mostra de modo direto e ao mesmo
tempo sutil a história de vida de cerca de um terço das pessoas que conheço. E
mesmo sem diálogos rebuscados, sem discussões aprofundadas leva o público a refletir
de maneira direta sobre determinados rumos do povo brasileiro, e refletir sobre
os seus próprios rumos.
P.S.
Será ainda possível pensar em possibilidades dessas no Brasil de hoje?!